STF e a precarização do serviço público: um retrocesso para a sociedade brasileira
Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) validou a contratação celetista de servidores públicos por meio da Emenda Constitucional nº 19/1998, representa um retrocesso preocupante para o serviço público brasileiro. Não apenas porque sua aprovação no Congresso Nacional foi irregular e o poder judiciário está referendando assim mesmo, mas também porque abre caminho para a precarização de um setor essencial à sociedade.
A Constituição de 1988 consolidou o regime jurídico único para os servidores públicos, garantindo-lhes estabilidade após o período probatório, uma medida que visa assegurar uma administração pública estável e eficiente. Com a aprovação da EC nº 19, essa estabilidade é ameaçada, pois novos servidores poderão ser contratados pelo regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que não oferece garantias de estabilidade e benefícios previdenciários diferenciados, típicos do regime estatutário. Essa mudança reduz a atratividade do serviço público para profissionais qualificados, uma vez que elimina as garantias que historicamente tornavam o setor público competitivo em comparação ao setor privado.
Outro ponto crítico dessa decisão é o impacto sobre o sistema previdenciário dos servidores públicos. Ao permitir que novos servidores sejam contratados pelo regime celetista, a decisão desestabiliza o equilíbrio do sistema de aposentadoria dos funcionários públicos. Com menos contribuintes para a previdência própria do setor público, o sistema se torna insustentável a longo prazo, como se o objetivo fosse implodir o sistema. A decisão diz que apenas os novos concursados poderiam ir para o novo sistema, mas essa fragmentação enfraquece a previdência pública de quem fica. E quem vai pagar essa conta? Mais uma vez os servidores públicos serão colocados injustamente como bode expiatório da sobrecarga das contas públicas.
A adoção da CLT para novos servidores também cria uma disparidade interna, onde servidores que exercem funções semelhantes podem ter direitos e benefícios diferentes, o que compromete o princípio da isonomia entre os trabalhadores. A falta de estabilidade e as menores garantias de progressão na carreira podem desmotivar profissionais que desejam dedicar-se a uma carreira pública estável e pautada pelo interesse público. A precarização das condições de trabalho impactará diretamente na qualidade dos serviços oferecidos à população, desde a saúde até a educação e a segurança.
A decisão do STF, ao validar uma emenda aprovada com graves irregularidades processuais, também abre um precedente perigoso. A EC nº 19 foi reintroduzida no segundo turno da votação após rejeição inicial, uma “manobra” que, segundo a ministra Cármen Lúcia, violou as normas constitucionais e o princípio de segurança jurídica. Ao legitimar essa emenda, o STF enfraquece o rigor necessário ao processo legislativo e coloca em risco a própria Constituição, uma vez que legitima ações que violam os procedimentos estabelecidos.
A decisão do STF reflete uma visão míope sobre a função pública e seus impactos de longo prazo na sociedade. A estabilidade no serviço público não é um privilégio, mas uma garantia de que servidores possam trabalhar sem pressões políticas e com dedicação plena ao interesse público. Com a flexibilização do regime jurídico, a contratação de servidores passa a estar sujeita a oscilações que podem comprometer a continuidade e a eficiência dos serviços prestados à população.
É urgente que a sociedade se mobilizem para proteger a integridade do serviço público e a própria Constituição. A adoção de um regime celetista para os servidores públicos representa uma ameaça real ao funcionamento do Estado e à qualidade dos serviços oferecidos à população. Mais do que nunca, é necessário um compromisso com o fortalecimento e a valorização do serviço público como alicerce de uma sociedade mais justa e eficiente.
A AFOJEBRA e os Oficiais de Justiça do Brasil lamentam profundamente esta decisão errática por parte do STF e estudará medidas legais para que a mesma seja revista.
Foto: Rosinei Coutinho/STF